Capítulo 3 - Brigado por me deixar entrar

Tinha me decidido que não iria subir e não tinha nenhuma obrigação de trocar qualquer palavra com aquele sujeito. Lanchei fora da loja depois voltei pra trabalhar normalmente, ouvi um comentário de uma das meninas sobre justamente o que eu queria saber.

-Viu que ele estava mais sério hoje?

- Vi, mas não perdeu a graça por isso

- Nem nunca perderá, pena que não me dá condições

- Pena que foi embora, isso sim. Mas o que será que ele tava fazendo aqui?

 

- Não sei menina, será que tá acontecendo alguma coisa na loja?

- Acho que não

Um cliente chegou e acabou o papo das duas , bom, pelo menos eu já sabia que ele já tinha ido embora, com certeza percebeu que nós não tínhamos assunto nenhum, e além do mais devia ser um homem muito do ocupado pra ficar esperando a minha boa vontade de falar com ele. Trabalhei o resto da noite muito melhor , curiosa , claro! mas rendi bastante do jeito que queria pro meu primeiro dia. Deixamos a loja limpa e organizada e depois eu fui liberada pra ir embora, era quase 21 horas. Fui pro ponto e o ônibus ainda ia demorar uns 25 minutos e eu estava sozinha no ponto então resolvi ligar pro meu namorado, não vi problema já que não estava num lugar abandonado.

- Oi meu amor saudades- Disse o Renan do outro lado da linha

- Oi amor, eu também como é bom escutar sua voz

- Esperei sua ligação o dia inteiro, mas pera ai você não tinha que ta indo pro trabalho

- Tinha... mas fui demitida - Disse triste

Demorou muito até que ele voltasse a falar

- Poxa amor, como isso foi acontecer em tão pouco tempo? 

- Derramei bebida em um babaca e ele foi desaforado comigo...

- E você não leva desaforo pra casa. Adivinhei?

- Exatamente isso, o lado bom é que consegui um emprego ainda melhor minutos depois, uma moça que estava por perto se sensibilizou e me ofereceu um emprego de tarde até de noite na sua loja de roupas.

- Jura minha princesa? Que notícia maravilhosa, fico muito feliz por você.

- Também estou feliz, terei que trabalhar mais do que na boate né, de segunda a sábado mas o salário é maior - Na boate só trabalhava fim de semana.

- Amor?

- Oi

- Qualquer coisa, volta pra cá eu estarei te esperando, a gente dá um jeito em tudo.

- Eu sei meu amor, mas tá tudo bem. Só não conta pros meus tios por favor, não quero que eles se preocupem a toa.

- Deixa comigo

Conversamos mais um pouco e depois eu desliguei a ligação, já estava quase na hora do ônibus passar.

- É muito perigoso uma moça a essa hora sozinha no ponto e falando no telefone.

Congelei, meu Deus era só o que me faltava ser assaltada. Tinha realmente dado mole, só consegui responder trêmula ao assaltante uma coisa:

- O que você quer ? Eu só tenho o celular pra dá, mas nada de valor - Disse me tremendo até ouvi uma risada debochada , na mesma hora virei pra trás e vi a imagem da qual fugir o dia inteirinho.

- Eu não quero nada além de conversar, isso se você não sair correndo pra longe de mim

- Pode falar- Disse derrotada

- Entra no carro comigo e vamos conversar num lugar sossegado. Daqui a pouco alguém chega aqui e eu não posso ficar muito exposto

- Não posso, meu ônibus já vai passar. E eu não vou a canto algum com estranho

- Porra Júlia eu vou ter que te arrastar pra merda do carro, jura que você quer que eu faça isso pra você baixar a bola? - Olhei pra ele passada com a mudança de voz de uma hora pra outra.

- Você não ousa encostar um dedo em mim

-Então entra no carro, eu te deixo na sua casa . Aliás se você puder me receber na sua casa vai ser muito melhor pra conversar.

- O QUE? NA MINHA CASA? NUNCA!

- o que você acha que eu vou fazer? te bater? estuprar?

- Não sei mas não vou arriscar

- Júlia eu sou uma figura pública, se fizesse isso você poderia me queimar pro mundo.

- E você me mataria e jogaria no matagal, sei bem o que esses famosos fazem pra não se queimarem.

- Bora Júlia, to perdendo a paciência de verdade. Olha, quanto mais você adianta nossa conversa mas cedo você fica livre da minha cara- Pensei bem, e era verdade eu que tava prolongando demais esse papo , tava na hora de encarar. Levantei e apontei pro carro, ele apenas confirmou que era aquele que deveria entrar. Percebi que tinha alguém dentro então fui pra trás.

- Boa noite - Disse o moço

- Boa noite - Respondi brava

O neymar sentou do meu lado pra minha surpresa, me fazendo afastar ainda mais pro lado. Quase beijando a janela.

- Qual seu endereço?

Só olhei, não concordando com a ideia dele ir na minha casa

- Só vou te deixar em casa se tiver um endereço em mãos ora - Disse , bufei e então disse ao moço grande que dirigia qual era meu endereço. Ele apenas assentiu

- Eu tinha um amigo que morava na mesma rua que você

- É mesmo? que interessante - Disse debochada, ele apenas riu do meu humor terrível

Não trocamos nenhuma palavra até chegar em casa. Só me dei o trabalho de pegar a chave na bolsa quando chegamos na rua.

 Dei um tapinha no braço do motorista agradecendo e desci do carro, e sai pisando fundo sem saber que o Neymar estava atrás de mim ou não, aliás , ele estava.

- Ow espera ai - Correu até ficar do meu lado, não consegui andar rápido o suficiente pra bater com a porta na cara dele. Entramos no meu apê com caixas e sem mobilia nenhuma. Só dava pra sentar em almofadas improvisadas no chão , esse garoto provavelmente estava acostumado com sofá chiquérrimo e eu não tinha nem um pra oferecer.

- Fique á vontade- Disse falso quando abri a porta de casa

Ele entrou, olhou pro vazio

- Pode se sentar no chão , tá limpo. Nossa mobília não chegou ainda

- Tudo bem, não me importo

- Agora pode adiantar

- Calma, nem uma água você tem pra me oferecer

Bufei, mas mal educada eu não era e fui na cozinha buscar a água. Abri a porta da janela e da varanda pra entrar um vento. Fui tirando a bolsa, o salto e lhe entreguei a água. Peguei uma caixa e sentei em cima de frente pra ele esperando que ele falasse. Acho que nem ele esperava tanta aproximação ficamos nos olhando um tempo , presos no olhar, um no outro . Fiquei tão nervosa com seu olhar que tive que iniciar de alguma forma a conversa.

- Estou esperando

- Bom, sobre a madrugada passada

- Olha, não precisa ficar...

- Deixa eu falar? - Me calei na hora

- Eu não sou daquele jeito, não te trataria daquela forma e deitaria a cabeça no travesseiro como se nada tivesse acontecido

- Vai falar que não dormiu também- Debochei

-  Não dormi Júlia, eu não sou daquele jeito, não trato as pessoas mal. Eu tava irritado com uma coisas minhas e você apareceu e aconteceu tudo aquilo. Eu não queria nunca te fazer ficar brava justo no primeiro dia na cidade, de trabalho e depois ver você pedir demissão foi chatiante de verdade. Eu fui caí em si quando cheguei em casa, com minha irmã falando na minha cabeça. Eu não queria que tivesse essa repulsa que tá tendo agora, não por um motivo tão bosta como foi esse.

- Olha só não precisa ficar chatiado, já passou e eu também não fui tão legal com você. - O QUE? EU DISSE ISSO MESMO? TA MALUCA JÚLIA O CULPADO É ELE

- Nós dois nos excedemos

- Você mais, só pra deixar claro - Eu ri desfazendo a tensão no ar

- Com certeza, mas to aqui pra começarmos de novo

Começar o que gente? Era só ele ir embora que tava tudo bem eu não era nada mesmo, ia me esquecer em dois passos.

- Começar? - Perguntei sem entender

- Eu me chamo Neymar, mas pode me chamar de Júnior- Estendeu a mão e deu um sorriso sincero e bonito de se  ver . Estendi a mão pra ele também

- Me chamo Júlia e pode me chamar de Jubs, jú, Julinha - Disse com a voz quase acabada quando reparei que ele fazia carinho com o polegar na minha mão. Ficamos os dois ali parados, com as mãos unidas, apenas nos olhando sem trocar uma palavra. 

Dei um pulo quando sentir a vibração do celular no bolso , tratei de desfazer o aperto de mão e ver quem era no celular. Tava com coração aos pulos, com certeza era do susto, não podia ser de outra coisa diferente. Olhei a mensagem do Renan e apaguei o celular sem responder.

- Era o cara com quem falava no telefone? - Que intrometido mds

- O cara é meu namorado

- Por isso você estava melosa no telefone, entendi - Fiquei muito constrangida

- Pois é

- Como que vocês vão fazer, ele aceita bem a ideia da mulher dele solta em santos

- Eu não estou solta. Nós confiamos muito um no outro, ele sabe que jamais eu deixaria nada abalar nosso relacionamento - Disse isso enquanto ele pegou minha mão novamente e ficou analisando minha aliança.

 

- Tem certeza, é muito difícil segurar um relacionamento você aqui e ele lá

- Nós vamos nos ver uma vez por mês pra matar as saudades , com confiança tudo fica fácil - Soltei minha mão rapidamente, já tava ficando nervosa.

- Uma vez por mês? Eu ia morrer ficar sem minha namorada, sem tocar , sem olhar , sem dá beijo - Disse com os olhos fixos nos meus

- é difícil mas a gente vai passar por essa

- E se ele não aguentar? - Quando ele falou isso, acordei de algum lugar em que me encontrava na hora.

- Além deu arrancar o pinto dele fora, eu daria o troco a altura - Saiu tão natural minha revolta, mas pensei melhor. - Não, o Renan nunca faria isso

- Como pode ter certeza- Disse rindo

- Você não o conhece, ele é o cara pra casar , ter filhos

- E você mesmo assim decidiu vir a puta que pariu ...

- Antes desses planos lindos, precisamos de um estudo, emprego. Você não deve entender, já que sabe o que é ser rico desde sempre

- Nada disso, antes dessa fama toda eu jogava bola na rua, e só estou aqui porque corri atrás que nem você está fazendo

- Que bom que conseguiu alcançar o seu objetivo - Disse com sinceridade

- Ainda tem outro objetivos em mente, casar, ter mais filhos também estão nos meus planos - O olhei surpresa

- Casar? Você não parece ser o tipo que gosta de ficar amarrado, ainda mais com tanta mulher dando mole - Disse dando ombros

- Todo mundo pensa isso o que não é totalmente mentira, mas eu também quero sossegar

- Só não sabe quando ainda né - Debochei

- Quando encontrar alguém valha totalmente a pena

- Como vai saber quem é essa pessoa rodeado de maria chuteiras, prontas pra fingir ser o que você quiser

-  Eu vou saber quem é a certa - Me encarou e eu encarei de volta - Ela será diferente desde a primeira vez

Senti um gelo na espinha

- Sorte pra você- SORTE PRA VOCÊ JÚLIA? ELE NÃO TA INDO FAZER UMA PROVA SUA ANTA, CALA BOCA VAI.

- Brigada, bom acho que eu vou embora já disse o que queria dizer

- Tudo bem, eu te levo na porta - Me levantei tentando acalmar meu coração com tudo que tinha acontecido aqui.

- Ok

- Acho que minha amiga teria um surto se chegasse aqui e se deparasse com você nessa sala

- Poderia voltar um outro dia, e dá um sustinho nela se você quiser

- Não, não precisa. Não ficaria bem um homem vindo aqui, se é que você me entende - Ele sorriu e se dirigiu até a porta.

- Viu, a conversa não doeu tanto assim

- Verdade, foi bom conversar e esclarecer.

Nos despedimos meio desajeitados e rimos do nosso desajeito

- Brigado por me deixar entrar, mesmo não tendo escolha - Disse sorrindo

Ri também

- Brigada por insistir, mesmo eu não tendo escolha - Fui fechando a porta enquanto ele descia de repente lembrei que ele não sabia onde ficava o botão pra abrir o portão lá de baixo. Sai correndo do apt e fui atrás dele. Ele se virou assustado quando me viu

- Aconteceu alguma coisa? Já sentiu minha falta? - Disse sarcástico

- NÃO, CLARO QUE NÃO - Disse alto - Só vim te mostrar onde abrir o portão

- Caramba, brigada, eu sinceramente não saberia se não viesse correndo me mostrar - Disse enquanto SOZINHO apertava o botão. Fiquei tão sem graça que só exclamei um ah! e tratei de subir rapidamente dando um outro tchau. Olhei pela varanda e pra minha surpresa ele ainda não tinha ido embora e estava também olhando. Fiquei tão assustada por ter sido pega no flagra que tratei de sair dali rápido, ele com certeza percebeu isso. Meu Deus que mico, que mico . Minha vontade era me enterrar no buraco mais fundo que tivesse mas invés disso, fui tomar um banho frio pra aliviar a tensão. Pensei no que tinha acontecido o tempo inteiro, até quando respondia a mensagem do Renan eu lembrei dele falando que também queria se casar e ter outros filhos, na verdade fui deitar com a imagem dele passando a mão na minha aliança , estremeci em baixo do lençol e depois peguei no sono profundo, cansado e feliz, não sabia exatamente o porque, mas feliz ...